O Supremo Tribunal Federal analisará se o julgamento sobre anistiar ocultação de cadáver tem repercussão geral e será julgado pelo Tribunal Regional Federal.
No Brasil, o Supremo Tribunal Federal irá revisitar uma decisão pertinente à anistia de crimes de ocultação de cadáver ocorridos durante a ditadura militar no país. A Anistia, que foi estabelecida em 05 de outubro de 1979, perdoou muitos indivíduos por crimes cometidos durante a época militar, mas alguns casos específicos continuam suscitando controvérsia.
Uma das questões que o STF irá resolver é se a anistia, que abrangeu diversos crimes contra a humanidade, inclui também o de ocultação de cadáver. A ocultação de cadáver é um crime grave, associado à ausência de certidão de óbito e geralmente está relacionada a mortes suspeitas ou forçadas. O Supremo irá avaliar se essa anistia deve ser aplicada a esses casos, considerando a legislação em vigor na época e a intenção da anistia em geral.
Repercussão Geral para Define o Alcance da Lei da Anistia
O caso em questão envolve uma denúncia feita pelo Ministério Público em 2015 contra Lício Augusto Ribeiro Maciel e Sebastião Curió Rodrigues de Moura, ambos tenente-coronel do Exército brasileiro, com o objetivo de condená-los por homicídio qualificado (Lício) e ocultação de cadáver (Lício e Sebastião), crimes cometidos durante a guerrilha do Araguaia. O Ministro Flávio Dino manifestou-se pela repercussão geral do julgamento, destacando que a questão central é definir o alcance da Lei da Anistia em relação ao crime permanente de ocultação de cadáver, o que se torna relevante.
A denúncia inicial não foi recebida, com base no argumento de que os atos praticados estão abarcados pela Lei da Anistia, declarada recepcionada pela Constituição de 1988, por meio da ADPF 153. Essa Lei concede anistia a crimes políticos e conexos ocorridos entre 2 de setembro de 1961 e 15 de agosto de 1979. Nesse contexto, a anistia é um tema crucial, pois extingue a punibilidade de todos os atos praticados até a sua entrada em vigor, mas surge questionamento sobre a aplicação da mesma em casos que se estendem ao tempo.
O Ministério Público Federal (MPF) interpôs Recurso em Sentido Estrito ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região, que ratificou a decisão do juízo de primeiro grau, com base nos mesmos fundamentos apresentados. Em 2024, o MPF impetrou Recurso Extraordinário com Agravo admitido pelo Supremo Tribunal Federal, com o objetivo de buscar a condenação de Lício Maciel. Sebastião Curió faleceu em 2022. A relatoria é do ministro Flávio Dino, que se manifestou pela repercussão geral do tema, enfatizando a importância da definição do alcance da Lei da Anistia.
O magistrado explicou que o mérito da questão é definir o alcance da Lei da Anistia em relação ao crime permanente de ocultação de cadáver. Dino ressaltou que não se trata de proposta de revisão do julgamento da ADPF 153, que decidiu que a Lei de Anistia foi recepcionada pela Constituição de 1988. ‘A aplicação da Lei da Anistia extingue a punibilidade de todos os atos praticados até a sua entrada em vigor. Ocorre que, como a ação se prolonga no tempo, existem atos posteriores à Lei da Anistia’, pondera o ministro.
O ministro também cita a Convenção Interamericana sobre o Desaparecimento Forçado de Pessoas, no qual o desaparecimento forçado foi expressamente tratado como crime de natureza permanente. ‘Reproduzo o artigo III da Convenção — promulgada, no Brasil, pelo Decreto nº. 8.766, de 11 de maio de 2016: ‘Artigo III Os Estados Partes comprometem-se a adotar, de acordo com seus procedimentos constitucionais, as medidas legislativas que forem necessárias para tipicar como delito o desaparecimento forçado de pessoas e a impor-lhe a pena apropriada que leve em conta sua extrema gravidade. Esse delito será considerado continuado ou permanente, enquanto não se estabelecer o destino ou paradeiro da vítima’’, registrou. Diante disso, votou pela existência de repercussão geral da matéria.
Fonte: © Conjur